Fazia tempo que eu queria conhecer o Western para além do cinema. Assisti despretensiosamente alguns filmes do gênero e me apaixonei. Escolhi para isso, conhecer um dos ícones dos quadrinhos: Tex.
El Muerto (1976) é uma das grandes histórias de Tex e fico feliz de ter conhecido o personagem por ela. Para amantes do Western, o italiano Tex é tão marcante no gênero quanto seu conterrâneo cinematográfico, o faroeste espaguete.
A trama começa com um jovem navajo e Jack Tigre, amigo de Tex, encontrando um grupo na estrada ao levarem mantimentos para a tribo. O grupo, sob liderança do desconhecido El Muerto, mata o jovem e fere brutalmente Jack Tigre, mandando-o lançar o desafio de El Muerto para Tex: um duelo no cemitério de Pueblo Feliz em uma semana. Tex, sabendo que o ato do desconhecido era uma provocação, decide ir atrás dele mesmo assim. No encalço de El Muerto, Tex assistiria novas vítimas do rival desconhecido: Kit Willer, filho de Tex, é alvejado no ombro e um xerife amigo do Ranger é morto. Ainda no caminho de Pueblo Feliz, o grupo que atuara a soldo de El Muerto tenta uma última emboscada contra Tex sem o consentimento do antigo chefe e acabam mortos. Após uma cansativa e sangrenta peregrinação de uma semana, Tex alcança a quase desabitada Pueblo Feliz. O duelo é precedido da revelação das motivações de El Muerto, antigas violências são rememoradas, e o duelo final tem espaço. A vingança de El Muerto fracassa.
A história em si, busca, com sucesso, evocar os tropos clássicos do Western. Indígenas e brancos se cruzando no limite da “civilização”, onde a lei, muitas vezes é feita com as próprias mãos. Não há pretensão de evocar temas menos óbvios ou algo sociológico, é tudo, para bem e para mal, bem formulaico. Podemos dizer mesmo que é o objetivo. Os diálogos são curtos e algo previsíveis, assim como os personagens, a leitura é fluída, o foco é na ação. E nisso, a decupagem é extremamente feliz. Sentimos que a leitura transcorre na velocidade da ação. A construção da trama chega célere no grande momento: o encontro entre Tex e El Muerto. Aqui, temos algo análogo a um “plot twist”: as motivações e a identidade de El Muerto são reveladas de maneira competente, nada mais resta, senão o desfecho fatal. O duelo, certamente, é o ponto alto. As tintas evocam o estilo marcante de Sergio Leone no final do clássico “Por uns dólares a mais” (1965). A alternância entre closes e panorâmicas, a tensão construída entre os antagonistas, a espera do momento de puxar o gatilho, formulaicas mas executadas com maestria.
A diversão despretensiosa dessa história, entretanto, tem como ponto fraco os personagens, para ser mais preciso, os protagonistas. Tex, Jack Tigre e seus amigos, não tem profundidade nem tons de cinza, são unidimensionais: o clichê do ranger honrado, generoso e temido, e seu amigo indígena, um companheiro fiel que confia em Tex mas tem (justas) reservas contra os brancos. Suas ações e falas quase que se escrevem sozinhas. O único personagem central com alguma tensão, que tem algo interessante, é El Muerto. Um homem atormentado pelo passado, perigosamente habilidoso, reconstrói sua vida apenas com o objetivo de enfrentar — de maneira limpa — seu antigo algoz.
Por fim, temos a arte de Tex. É um traço comercial, datado, impossível não lembrar mesmo do marketing de meados do século XX. Não há grandes pretensões artísticas mas funcionais. É voltado para uma narrativa rápida e clara, deixando pouca margem para experimentações que busquem deslumbrar o leitor ou provocar reflexões. O que, para mal e para bem, casa perfeitamente com a proposta de ser uma leitura western divertida e acessível para o grande público.
Em suma, é uma leitura para se divertir, não para refletir. É como se fôssemos numa matinê de Western no cinema de rua de uma cidade pequena em meados do século XX. As horas em que passamos entretidos com a leitura voam, mas não nos deixarão impressões profundas. Nisso, El Muerto é bem-sucedido. Mas, deve-se dizer, a superficialidade dos protagonistas e a arte excessivamente funcional, chegam a atrapalhar. E nisso, o faroeste espaguete leva vantagem, apresentando personagens marcantes como O homem sem nome e uma estética que revolucionou o gênero.